Milagres se regem.

Uma estaca no peito
Nó na garganta
O grito preso
Somente vagando no escuro

Nem mais minha sombra
Segue-me sem que a perceba
A dor dilacera
Corpo, mente, espírito

Somente a luz Divina me guia
Acompanha, ouve
Sabe de cada grito no eco do peito
Sabe de cada passo que não vejo

As vozes me sopram
Velozes e atrozes vultos vivos
Outrora fantasmas
Insistem em fazer da terra limbo
E, vagueiam, rondam na surdina

Tão perto, mais do que longe
De todos os lados e cantos
No mesmo cômodo
Sob o mesmo teto, acima, ou abaixo

Fazem reviver o que já era esquecido
Mas, somente oculto
Em repouso, mero descanso

Patologias caseiras coabitam
Reproduzem-se em laboratórios clandestinos
Como velhos magos, velhas bruxas

Como há muito já não se falava em magia
Como ansiãos matemáticos
Que calculam destinos
Provocam desatinos

A fórmula química oculta
Que paralisa aos poucos
Pequenas doses de insanidade
Que flagelam lentamente
Em suas ditaduras

Outrora arte, hoje, sangra
O que ninguém mais vê
Mas, sinto, derrama
Como se até hoje estivesse em suas entranhas

O que era para ser umbilical
Sempre foi espeto, faca, tesoura
Espada, chicote, o alvo e a lança
Deuses e anjos viraram escudos

Muitos ao lado d’Ele
Sopram alguma esperança
O zelo, o conforto, o laço
Que abraça sem ser nó
A voz doce que me sussurra do além

Algo de nós ainda vive, sobrevive
Todos os planos regem seu tom
Que ilumina o caminho
A direção sem tropeço

Segredos velados, desenterrados
Para outros, sepultados
Garimpos de um ouro que não me reluz
Somente cega o seu clarão ardente

Que queima minhas entranhas
Herança de gerações
Que zelo mais que minha alma
Meu ventre que pra sempre sangra

E, ergo meu grito contido aos anjos
Para que façam morada ao nosso redor
Protejam o que me vem de dentro
Seja do ventre, ou do coração

São Miguel e São Jorge
Arcanjos e Santos
Todos os bons deuses do olimpo
Levantem seu brado em meu grito

E, sigo…

Mesmo sem bem saber
Mesmo sem ver
Mesmo que não ouça
Mesmo que os sentidos confundam

Que braços e abraços se fundam
Que meu escudo seja meu e dos meus
Que toda força vença a desavença oculta

Que a quem bem amo seja recíproco
Que o sentimento puro volte a ser verdadeiro
Que meus passos sejam rocha
Que se ergam como um monte

Que seja morada de Sião
E, a estrela de Davi reluza minha estrada
Que toda treva se esvaia
Que haja paz, e não mais guerra

Onde houver o desafeto
Ainda que um dia eu os tenha sido feto
Que não me afete
Mais do que o tempo perdura na dor

Que por onde caminharem meus passos
Haja somente Deus
Santo Antônio e São Francisco
Olhem também pelos meus

Que São Cosme e São Damião
Sejam os doutores da cura
Que seja escrito o quarto milagre de Fátima
E, vivam todos

Que habitem a terra os do bem
Não os de bens
A matéria fica, corrói
O bem oculto é o que sobrevive

Julgamento algum será humano
Deus baterá todos os martelos
Mãos humanas serão somente instrumento
Da dádiva do milagre por vir

E, sim, como uma criança
Ainda acredito em milagres
Mas, já não mais choro
Faço-os acontecer.

(Alessandra Capriles)

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