Acreditam em coincidências?

Tô eu lá no app vendo os aptos para alugar, e, assim que entro, deparo-me com esta imagem. Na hora, paro e penso: “Mas, eu conheço esse quadro.”

Sempre estou deparando-me, por aí, com quadros dos meus pais, mas esse me chamou a atenção, porque também o tenho na parede de casa. Bem como tenho o casal de cholos que está, ao fundo, na parede, que era feito por outro artista.

Para quem não sabe, papi e mami foram um dos fundadores da, hoje, tão famosa, Feira Hippie de Ipanema, na General Osório, na década de 70, junto com um grupo de amigos e artistas. Eles ocuparam a praça com a sua arte, e caíram na graça do povo, tempos depois.

Ela está bem mudada, muitos grandes artistas, da época, não estão mais lá, e a essência parece que também não é mais a mesma.

Eles começaram pequenos com seus lindos e bem trabalhados quadros de cobre, tão ricos em detalhes e cores, e algumas telas em tinta óleo. Depois, mudaram-se para Salvador. Meu pai, que também era administrador de empresas, foi prestar serviço para a Odebrecht, e por lá ficaram, durante 7 anos.

Papito recebeu uma boa proposta, por aqui, e resolveu voltar ao Rio. Quando voltaram, a feira estava maior, mas ainda não estava em seu auge, foi quando eles resolveram inovar com quadros espelhados jateados e também pintados, que viraram febre, à época.

As vendas aumentaram, vinha gente do mundo todo comprar com eles. Quando nos demos conta, tanto a nossa casa, quanto a feira, estavam cheias de gente famosa, de todos os cantos.

Eram artistas, produtores de TV, novela, filmes, e eles estavam nas paredes de todos os cenários e casas dos anos 80. Minha mãe diz que quando eu nasci foi quando tiveram mais sorte e mais ganharam dinheiro na vida. Que bom, que, pelo menos, quando nasci dei alguma alegria a eles, né. 😂

Meus pais eram vizinhos de porta, quando se conheceram. Minha mãe veio do Pará trabalhar como modelista e costureira, e meu pai veio da Bolívia estudar administração na UFRJ. Apaixonaram-se. Batalharam muito. Tiveram 4 filhos, prosperaram. Chegaram ao auge da fama com sua arte. Um privilégio e um enorme orgulho para qualquer artista, que sabe que esse é um caminho difícil. Além de ambos terem conquistado juntos vários prêmios, depois de separados, minha mãe também ganhou um prêmio em evento e cerimônia, na Academia Brasileira de Letras: ídolo. E, eu não tenho nem um poema lido ali. 😂

Ela foi guerreira. Costurava, vendia roupa, era artista plástica, vendia os quadros, vendia o serviço de decoração de interiores, junto com os quadros, era mulher, esposa, mãe. Fomos ricos. Muito ricos. Tínhamos um belo e enorme apartamento de quase 300m², 2 carros do ano com motorista, empregados, éramos sócios em clubes, viajávamos sempre, estudávamos em boa escola, fazíamos cursos… enfim…

Mas, a vida é para quem sabe viver com humildade. Eu só nasci rica, pois, aos 7 anos, já estava na mesma condição que me encontro até hoje. E, não sei dizer por quantos altos e (muito mais) baixos passei, nesse percurso. Que sorte eu tenho. Aprendi cedo. Sou privilegiada em muitos aspectos, embora não pareça, e muitas vezes não me sinta.

Além da grande memória que tenho da infância, tenho muito presente a disposição dos objetos e detalhes da nossa antiga casa. Tenho muito vivo na memória o primeiro quadro que meu pai pintou em tela. Ele ficava ao lado da minha cama, e eu, que já tinha insônia, quando não ia dormir na rede, na varanda, ficava brincando com os dedos de subir e descer por suas escadas infinitas. E, desculpe-me, Escher, mas meu pai teve essa ideia primeiro.

Outra memória viva que tenho é do primeiro desenho que ele fez para seu primeiro quadro de cobre, e foi o Inti Sol que tenho tatuado nas costas, que é a cópia do mesmo desenho original. E, por acaso, hoje, além de me deparar com esse anúncio e esses quadros, que eu adorava imaginar que estava brincando no lago junto com as garças, a minha mãe também veio me dizer que ganhou de presente do meu pai, quando eu nasci, um quadro que tem na entrada da casa onde moramos, e nele está desenhado também o Inti Sol, o mesmo que tenho tatudo nas costas.

Tudo isso é para dizer que se alguém tiver o contato de Dan Brown, podemos escrever um novo livro no estilo de “O Código da Vinci”, porque, hoje, acordei, além de nostálgica, toda trabalhada no misticismo. 😂

E, se alguém estiver procurando um apartamento para alugar, segue uma boa dica, aí. Aproveita e manda um abraço meu ao inquilino, ou proprietário, por manter viva a memória da arte dos meus pais.

(Alessandra Capriles)

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